Ser muito agitado, fazer várias coisas ao mesmo tempo, não parar um minuto. A princípio, tais características não constituem um problema, apenas um estilo de comportamento e de vida. A questão merece atenção se o excesso de atividade compromete o necessário descanso, ou se por trás existe uma situação emocional de fuga ou algum transtorno como a hiperatividade.
"Neste último caso, a pessoa inicia muitas tarefas, mas se perde no meio", salienta Blenda de Oliveira, psicanalista pela Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP).
Por isso, a recomendação é ficar atento para ver se a agitação é um aspecto da personalidade ou indício de algum problema.
"Algumas pessoas, naturalmente, têm mais disposição e conseguem realizar um grande número de atividades, seja porque nasceram como essa aptidão ou a desenvolveram com os anos. Outras, devido à ansiedade extrema, estão sempre correndo para resolver tudo ao mesmo tempo, não suportam deixar nada para depois. E há aquelas que são portadoras do Distúrbio de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDHA), que, como já foi dito, traz embutida a dificuldade de dar continuidade e manter o foco nas ações", analisa Miriam Barros, psicóloga clínica pelas Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU) e psicodramatista pela PUC-SP.
Desgaste permanente
Então, as recomendações para quem vive com o pé no acelerador são basicamente duas: verificar se tal conduta vem trazendo prejuízos para a saúde e se não esconde conflitos emocionais ou disfunções como a citada hiperatividade. "Caso não exista nada disso no contexto, é provável que o indivíduo consiga dar conta de tudo porque é competente e, dessa forma, organiza seu tempo e se mantém focado e altamente disciplinado. Assim, consegue se manter em harmonia e equilíbrio", diz Blenda de Oliveira.
"Em geral, são pessoas com grande agilidade mental, capacidade de síntese, objetividade para resolver problemas, organização e habilidade para delegar tarefas, não postergando situações a serem resolvidas", completa Miriam Barros.
Mas é importante considerar que a aceleração pode, sim, trazer problemas para a vida pessoal, social, profissional. Afinal, é muito provável que o ritmo alucinante resulte em um desgaste contínuo, principalmente físico. "Uma coisa é a agitação fazer parte do jeito de ser do sujeito, que sabe lidar com isso. Outra é estar no lugar de algo que ele não consegue enfrentar – ou seja, acelera para não ter que refletir, decidir, escolher. Aí, podemos falar em prejuízo", salienta Blenda de Oliveira, que é psicoterapeuta de adultos, adolescentes, crianças, família e casais.
Convívio prejudicado
Os danos podem acontecer especialmente nas esferas familiar e social. "Na família, acaba sobrando menos tempo para o convívio, gerando afastamento, mágoas ou desentendimentos, pois nem todos agem da mesma forma e é difícil compreender e lidar com aquele que vive correndo. Socialmente, há menos energia para investir", pondera Miriam Barros, acrescentando que, no trabalho, tal característica costuma ser favorável. "O indivíduo lida bem com as pressões e a correria do cotidiano."
Um segundo ponto a considerar é o quanto essa característica interfere e incomoda as pessoas à volta. Sim, pois o "acelerado" tem que compreender que este estilo pertence a ele, e não ao mundo – e, dessa forma, não dá para exigir o mesmo ritmo de todos com quem convive.
"Quem está por perto, geralmente reclama que o apressado se mostra intolerante, impaciente e exaustivamente exigente, pouco respeitando os demais. Por isso, é fundamental que cada um cuide do seu compasso e compreenda que o mesmo é individual", diz a psicanalista Blenda de Oliveira.
Saúde em risco
Para a saúde física e mental, pode haver danos, como fadiga, insônia, respiração ofegante e distúrbios digestivos e cardiológicos. "Quase sempre, o ritmo exageradamente veloz é decorrente e causa de quadros de ansiedade, irritabilidade, impulsividade e hiperatividade", diz Oliveira, destacando o perigo de o indivíduo entrar num processo de exaustão e não se dar conta de que há sintomas físicos e psíquicos alertando-o de que precisa parar.
Toda química é alterada cada vez que sentimos agitação, ansiedade, estresse. "Então, alguns órgãos sofrem com isso e propiciam as doenças", adverte Miriam Barros. Há também o risco de a pessoa desenvolver transtornos psíquicos por não conseguir estabelecer prioridades: neste contexto, tudo passa a ser igualmente importante e urgente. "Nesse ponto, muitos se perdem e deixam de cuidar de outras variantes essenciais na vida, como os relacionamentos."
Cobranças do mundo
Muitas vezes, apenas um médico – como o psiquiatra ou o endocrinologista – identificará que, por trás do ritmo ligeiro, há um distúrbio mais profundo que precisa ser tratado. Portanto, convém procurar ajuda especializada se a pessoa sente que não está bem. Com auxílio, será possível encontrar o equilíbrio.
"Para muitos, é difícil não se contaminar pelo que está em volta porque tudo, hoje, leva à aceleração. E há uma ideia de que precisamos ser multitasking (termo retirado da informática que significa 'operação que permite executar de modo aparentemente simultâneo várias tarefas ao mesmo tempo') em quase tudo, provando assim nossa eficiência, performance, inteligência, competência e tudo que se relaciona com o poder de ser vários ao mesmo tempo – uma espécie de onipotência", pondera Blenda de Oliveira.
Miriam Barros concorda: "Existe a mentalidade, que precisa ser mudada, de que as pessoas que trabalham 16 horas por dia são mais produtivas e melhores profissionais do que as que se disponibilizam oito ou dez. A produtividade, entretanto, depende do envolvimento com o trabalho e da dedicação no momento da tarefa, e não das horas em que se passou debruçado nela."
Veja, agora, dicas para ir mais devagar – caso perceba que o ritmo rápido demais está atrapalhando sua vida
COMPENSAÇÃO: identifique o que quer compensar com o uso abusivo da internet. "É importante ter ciência daquilo que sente falta", diz a psicanalista e neurocientista Nanci Azevedo Cavaco .
ALIENAÇÃO: faça uma lista de tudo que está deixando de lado em detrimento das horas sem fim em que fica na internet. "Assim, perceberá o quanto está alienado e improdutivo"
AO AR LIVRE: procure preencher seu tempo vago com atividades ao ar livre ou em ambientes onde não há computadores. "Quebre a rotina, usando sua criatividade", sugere a psicanalista Araceli Albino.
LIMITE: estabeleça um horário e um tempo para entrar e sair na web, recomenda Araceli Albino. "Se julgar necessário, coloque um despertador para tocar quando atingir o limite. Isso evitará que, por distração, permaneça mais tempo do que o planejado", completa a psicanalista e neurocientista Nanci Azevedo Cavaco .
CONSCIENTIZAÇÃO: tome consciência de que as coisas continuarão como sempre foram independentemente da sua participação na rede. Mas, no que se refere a sua vida, há muito o que mudar.
MEDITE: com práticas que o levem a meditar, busque a interiorização. "Dessa forma, regularizará a respiração e diminuirá a ansiedade, além de adquirir mais lucidez sobre si mesmo" .
RELACIONAMENTOS: priorize o contato direto com as pessoas. "Converse com sua família, conviva com quem gosta, estabeleça e fortaleça as relações amorosas e de amizade", salienta a psicanalista Araceli Albino.
DISTANCIAMENTO: por fim, compreenda que a internet pode aproximar quem está longe, mas distancia quem está perto, conforme analisa a psicanalista e neurocientista Nanci Azevedo Cavaco.
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